No mês de março, testemunhamos uma corrida bancária que resultou na segunda maior falência bancária da história dos Estados Unidos – a do Silicon Valley Bank (SVB), o queridinho da indústria de capital de risco e start-up na Califórnia.
O SVB era o 16° maior banco americano e tinha depósitos e ativos avaliados em quase US$ 200 bilhões. Em apenas dois dias, entre 8 e 9 de março, enfrentou uma enxurrada de saques e quebrou.
Para colocar isso em contexto, a maior corrida bancária anterior na história moderna dos EUA ocorreu no banco Washington Mutual em 2008 e totalizou US$ 16,7 bilhões ao longo de 10 dias. É uma gota em relação ao que foi visto no SVB.
Os clientes do SVB sacaram US$ 42 bilhões de suas contas em apenas um único dia. Foram US$ 4,2 bilhões por hora, ou mais de US$ 1 milhão por segundo durante dez horas seguidas.
As corridas aos bancos são particularmente desastrosas devido ao efeito bola de neve. Se um grande depositante expressar sua preocupação e sacar seus fundos, isso pode causar uma reação em cadeia onde outrossn depositantes farão o mesmo, pois não querem ser o último a arcar com as consequências.

No caso do SVB, quando o banco tentou, sem sucesso, levantar US$ 2 bilhões para sustentar seu balanço, investidores proeminentes, incluindo Bill Ackman, começaram a soar o alarme. Isso levou os depositantes a entrar em pânico e retirar seu capital.
MAS COMO CHEGAMOS AQUI?
Quando olhamos para o Silicon Valley Bank e porque ele quebrou, podemos ver dois grandes fatores de risco.
O primeiro era o risco de mercado. O SVB investiu seus ativos em títulos do governo que geralmente são considerados seguros e possivelmente teria pagado o principal integralmente se os ativos fossem mantidos até o vencimento. No entanto, como eram marcados a mercado (ou seja, avaliados pelo preço de mercado atual), o banco enfrentou bilhões em perdas não realizadas quando as taxas de juros subiram e os preços dos títulos caíram. Como os clientes estavam sacando mais do que depositando, o SVB teve de vender esses títulos em um momento terrível, transformando perdas não realizadas em perdas realizadas e rapidamente, ficou insolvente.
Quando analisamos profundamente as demonstrações financeiras do SVB fica evidente a enorme incompetência (para dizer o mínimo) no gerenciamento de riscos do portfólio.
O segundo fator de risco era o de liquidez. Bancos regionais tendem a ter bases de clientes concentradas, muitas vezes operando em setores específicos. Isso os torna vulneráveis quando essas indústrias passam por uma crise. No caso do SVB, eles atendiam principalmente a grandes contas comerciais e, portanto, a maioria dos depósitos não era segurada pelo FDIC* (similar ao FGC no Brasil). Esses tipos de depósitos saem rapidamente se houver algum sinal de problema. Quando o rumor se espalhou e os resgates aceleraram, o banco não tinha ativos líquidos suficientes para pagar seus depositantes.
Na verdade, banco algum teria.
Explico:
SISTEMA BANCÁRIO DE RESERVAS FRACIONÁRIAS
O sistema bancário dos EUA, por lei, autoriza que os bancos mantenham apenas 10% dos fundos dos clientes em dinheiro físico disponível para retirada e todo o resto é emprestado ou investido. É assim que os bancos funcionam, é como ganham dinheiro.
Quando você vê $ 10.000 no saldo da sua conta, esse valor não é realmente respaldado por dólares. Em vez disso, esse número é apoiado por uma ampla mistura de ativos menos líquidos, incluindo títulos do Tesouro, empréstimos hipotecários, empréstimos de cartão de crédito, empréstimos comerciais e vários outros.

Pela natureza do modelo, até mesmo o JP Morgan, o único banco com uma pontuação G-SIB de 4, o que significa que é classificado como o banco global sistemicamente mais importante do mundo, teria dificuldades em prover liquidez imediata a todos os seus depositantes.
CONTÁGIO CONTIDO?
Por enquanto, o risco de contágio parece limitado. A maior parte do sistema bancário tinha uma exposição pequena ao SVB, ao contrário de 2008, quando todos os maiores bancos tinham exposição maciça uns aos outros.
É importante relembrar que no período de 2006-2008 os bancos tinham uma alocação extraordinariamente baixa para ativos nominalmente livres de risco, como dinheiro e títulos do Tesouro. Em vez disso, estavam fazendo empréstimos de forma muito agressiva e comprando títulos mais arriscados, e muito disso explodiu.
Após o pânico de 2008, ocorreu uma mudança radical e os bancos se tornaram mais conservadores (inclusive os brasileiros) e, especificamente, menos agressivos nos empréstimos. Atualmente, a maioria deles tem uma posição bastante conservadora.
Apesar de a foto do momento assustar, minha perspectiva para o setor como um todo, especialmente para os grandes bancos, é positiva para os próximos anos. Ouso inclusive afirmar que o sistema bancário é, atualmente, uma das áreas mais fortes e consistentes de toda a economia americana.